quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Nós




Eu não conseguia acreditar. Não adiantava, eu lia, relia, lia outra vez, mas não acreditava. Era como se fosse um sonho, ou melhor, um quase pesadelo, desses que você sabe que logo vai acordar. Aí você se belisca e nada, não acorda. Não é sonho. É a vida real. É ruim. Aquilo que você mais temia aconteceu.

Seus dias de mil conversas jogadas fora, sobre os assuntos mais bestas e idiotas possíveis, as festas de pijama que só vocês sabiam fazer, até porque só vocês participavam. As voltas de bicicleta e os passeios com os cachorros. As aulas de direção. As compras, daquelas que você experimenta um montão de roupas e no final não leva nada, depois só comentários e gargalhadas lembrando disso, e de outras coisas, e do que surgir pra lembrar naquele momento. Não importa, sempre surgiam coisas pra lembrar, e rir, e bagunçar, e festejar... Sempre surgiam.

É clichê, e é bem verdade, que coisas boas, talvez as melhores, são raras e rápidas. Esse é um caso. Como podia existir tanta sintonia e harmonia ao mesmo tempo? Mesmo com todas as circunstâncias afirmando o contrário, no meio duma bagunça tremenda deu pra surgir uma coisa boa. E bote boa. Foi ficando forte, amadureceu, criou laços, raízes, se tornou verdadeira e cheia de amor. Mas amor de verdade, não amor que passa, que acaba com o tempo e com a distância. Amor.

Mas aí você recebe uma mensagem, e descobre que isso tudo vai acabar no passado. Vai ser lembrado? Vai. Mas só. Porque todas essas coisas boas vão acabar, assim, do nada. Dum dia pro outro. Porque a vida é assim, ela te traz pessoas boas, mas ela leva também. E foi exatamente o que aconteceu. Não pra sempre, mas por um longo momento. E só de ser um momento, já é o suficiente pra ser dolorido.

As pessoas não te entendem. Não todas. Aliás, são pouquíssimas as que, por pelo menos um segundo, conseguem te escutar. Agora você sai na rua e vê que não é a mesma coisa. Falta alegria, as risadas e as conversas bobas, puras, sem malícia. As coisas chatas também não existem mais. Certas coisas deixam de fazer sentido. Agora você não tem mais com quem dividir aquele pastel e aquele suco. Você não tem quem queira ir ali rapidinho pra nada, pra fazer absolutamente nada. Porque é isso que vocês faziam, nada. Vocês só queriam ser vocês, mesmo sem fazer nada. Mesmo que fosse só pra dar as caras. Não importa. Era o que vocês faziam de melhor.

Com o tempo você até acostuma. Andar por aí sem alguém pra comentar qualquer coisa, entrar em lojas sem alguém pra te dizer: legal, bonitinho, e minutos depois: ainda bem que você não comprou, tava muito caro. Mas não era só disso que eu sentia falta. Ter alguém pra cuidar, pra dar bronca, pra chorar junto. Tudo era legal. Até as coisas mínimas faziam sentido quando existia nós. Não me importa que uma ou outra pessoa não goste, eu gostava! Era simples, mas era nosso. E era único.

Não pensei que voltaria. Tanto tempo depois, ainda não acredito. Mil coisas vagando pela minha memória. Já consigo sentir o aroma, imaginar as risadas, as idiotices. Porque não existe nós sem essas coisas, sem as coisas mais inimagináveis, sem as coisas mais inesperadas. Porque a gente é assim, uma mistura do inusitado com o estranho, e uma pitada de loucura. Mas uma loucura sóbria, se é que existe. Porque o nosso nós é equilibrado, e engraçado, e tem gosto de quero mais, tem gosto de lembrança, de algodão doce, de bolinha de sabão. Doce como açúcar, bonito como a neve, leve como o vento, duro como um diamante e eterno como aquilo que nos faz viver.

2 comentários:

  1. Tocante..sempre que leio me imagino ao teu lado dando aquelas gargalhadas ensurdecedoras. .e sempre por motivos bobos e idiotas. ..mas que arrancam as risadas mais gostosas...recordar é viver..e sentir -se voltando no tempo..te amo

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  2. E quantos momentos bons né? Serão sempre lembrados e guardados com muito carinho, tenha certeza. Beijo beijo beijo!!!

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